sábado, 8 de outubro de 2011

A Verdade Histórica - Por: José Cícero

O conhecimento dos fatos históricos não é e, tampouco, pode ser em qualquer tempo privilégio de uns poucos e de ‘seu ninguém’. Cada um quer seja pesquisador por vocação, hobby ou historiador por academicismo ou por cátedra, terá o direito sagrado de acreditar naquilo que bem entender. Contudo, a ciência está aí, gritando alto quase a romper os nossos tímpanos. Os fatos ainda rastejam (no caso do cangaço lampiônico) pelos sertões adentro, grávidos de verdades. A verdade às vezes salta aos nossos olhos em alguns momentos saturados pelo carvão do tempo. E muitos de nós, pobres mortais ficamos como cegos diante dela, pela enormidade da nossa própria arrogância... E isso não é bom, posto que é extremanete negativo para que deseja descubrir verdades sob o biombo autêntico da história.

Mas é imperioso que vejamos, igualmente, com o tato das mãos e a sensibilidade do coração o óbvio ululante, somado a uma dose considerável de experiência empírica, desprendimento e companheirismo como a argamassa necessária à corporificação da verdade que almejamos constatar. Posto que, pela história escrita nos transportamos muito além do tempo... Ainda, que tenhamos a capacidade de puder dividi-la com os outros. Por conseguinte é preciso que vasculhemos os pergaminhos dos que chegaram ao palco dos acontecimentos primeiros que nós. Que sejamos verdadeiros o suficiente. Os “ratos de biblioteca”, freqüentadores de sebos. Aperreadores dos amigos ante a sede de saber sempre mais. Que sejamos dados aos livros... ‘Livros à mão cheia...’ Que alimentemos a ousadia, tanto quanto a tenacidade no itinerário da busca cotidiana. Que sejamos capazes de cultivar a humildade como uma lanterna de popa que nos dará o rumo certeiro do caminho a ser seguido tal qual um Dom Quixote e seu Sancho Pança das bibocas do mundo. Notadamente, que saibamos ouvir a oralidade dos mais antigos, como uma fonte indispensável de informação e ferramenta de sabedoria.

deputado Inácio de Loiola e José Cícero

Pois lá, no fundo escuro desta leitura, bem como nas informações do povo – principal protagonista desta saga -, é que jaz o ouro da verdade que buscamos a todo custo encontrar. A verdade que procuramos como o ‘elo perdido’ da história que nos falta para construirmos de uma vez por todas, os alicerces inquebrantáveis do edifício histórico a que nos propomos edificar em nome do passado, do presente e do futuro. E, digamos, que no estudo analítico e descritivo do cangaço nordestino(por exemplo) não é lá muito diferente de outros fenômenos sociológicos ocorridos pelo Brasil e pelo Globo. Razão da nossa necessária modéstia e ponderabilidade na qualidade de estudiosos e observadores atentos da fenomenologia cangaceira caririense e nordestina.

Nós, os pesquisadores, o mínimo que podemos fazer é lançar um pouco mais de luz sobre os acontecimentos, e não nos arvorarmos como seus donos. Tudo com base no estudo, na análise dos fatos, na comprarão e, sobretudo na pesquisa. Sem, contudo, perdermos de vista o foco central em nome de uma contraproducente posição de faraó – dono da verdade e porteiro-mor dos caminhos objetivos. Nunca é demais ressaltar que, ser inteligente é também ser simples e modesto. Todo o resto neste campo é falso e fisiológico.

Nada no estudo, quanto na pesquisa pode ser tão negativo e inaceitável quanto a demonstração da intolerância/arrogância. Por isso, é mister dizer que, qualquer arrogância é sempre pior do que a ignorância. Quem procura a verdade teve está preparado o tempo todo para as pequenas descobertas como a verdadeira pavimentação para o caminha das grandes conquistas. Aprender deve ser inapelavelmente a palavra de ordem. Mas, sobretudo saber dividi-las com seus companheiros de caminhada. Partícipes de uma mesma causa. Protagonistas de uma mesma luta e dedicação. Assim como, dos que porventura estejam igualmente à margem do caminho. Pois ninguém jamais saberá o suficiente, ao ponto de querer se impor como o dono da verdade absoluta. O mundo, assim como a própria vida é, amiúde, uma sucessão de descobertas. Ninguém saberá tanto, que não possa aprender com o mais humilde e incipiente dos aprendizes. Tudo na vida é inconcluso como diria Freire. Aprendemos, portanto, enquanto ensinamos e dividimos o pouco que sabemos...


Mesa de Debates: Angico, SESC Crato
Por mais que não aceitemos, toda verdade é dimensional e, por conseqüência tem seu quê de relativo. De forma que não podermos, por nenhuma razão, afastar ou mesmo querer desconsiderar o seu caráter subjetivo que se plasma segundo a contribuição e compreensão de cada um dos indivíduos envolvidos. A verdade em muitos casos, é filha do tempo e não da força ou da imposição descabida, como de quando em vez presenciamos por alguns pseudo-arautos da história ou vendilhões do templo. E digamos por fim, que nos estudos e nas pesquisas do cangaço lampiônico nada até agora foi diferente.

A ilusória ditadura do conhecimento é um câncer que destrói aos poucos a historiografia planetária e dos grotões dos esquecidos. Urge então, que nos afastemos dela enquanto há tempo. É urgente, portanto, que caíamos 'na real'. Que todos aqueles que por algum motivo, ainda continuam se imaginando donos da verdade que se conscientize dos seus malefícios, enquanto processo de estudo e aprendizagem. É notório que este comportamento não ajuda em nada quanto ao processo evolutivo do estudo do cangaço, por exemplo. A menos que não queiram o crescimento desta causa. A menos que não queiram que o domínio deste conhecimento histórico não venha se tornar um patrimônio do povo. A menos que continuem achando que o conhecimento da história, seja um monopólio como no passado de uns poucos. Que se ache um prodígio. Um supra-sumo da história. Um ser iluminado e insubstituível. Mas convenhamos. Isso não é certo. E nunca será.

Há que sejamos solitários com as massas sertanejas. Sobretudo, com os que têm sede de conhecer a verdade sobre si mesmos e do solo em que nasceram. Há que distribuir com os outros o conhecimento que acumulamos durante a existência sob os nossos esforços de pesquisa. Toda história verdadeira é um patrimônio da humanidade e, em especial, daqueles que a viveram a ferro e fogo. Toda história como uma construção social só teve pertencer aos seus próprios sujeitos. E com o cangaço nordestino nada disso pode ser diferente. Há que se ter uma visão holística também em relação a história e os seus desdobramentos mais gerais...

Cultivemos, além da solidariedade, a humildade como uma das ferramentas fundamentais para a difusão do que foi de fato a temática do cangaço – o maior fenômeno social e político dos sertões nordestinos. Que possamos ter aprendido um pouco mais durante a terceira edição deste Cariri Cangaço. Na certeza de termos coletivamente contribuídos para a história do Cariri em particular e do Nordeste em geral – só isso já será um grande feito. Algo digno de nota e elogio. E tudo isso é, deveras fruto de um esforço coletivo.

Como de resto, direi: quem quiser contestar, por exemplo, o que de fato aconteceu em Aurora. Isso é mais do que louvável – é primordial, justo e necessário. Contudo, terá que no mínimo, ter lido algo pertinente ao que aqui aconteceu por estas bandas; estudado, pesquisado, escrito... E assim ter conseguido se despir de qualquer ranço de proprietário da verdade absoluta.
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José Cícero -
Secretário de Cultura de Aurora
Conselheiro do Cariri Cangaço
Aurora-CE
http://www.blogdaaurorajc.blogspot.com/

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