O bioma sertanejo que além de frágil é também considerado único entre
todos os ecossistemas terrestres, vem sofrendo ao longo dos anos uma série cada
vez mais crescente de degradação e desequilíbrio. O que por sua vez compromete seriamente o
futuro da fauna e da flora da região. Recentemente, mais um fenômeno tem chamado a atenção, sobretudo de curiosos
e pescadores ribeirinhos, não somente no município de Aurora.
Trata-se de
verdadeira ‘infestação’ de uma nova espécie de peixe; ao que tudo indica
exótica; já que não faz parte das espécies endêmicas que povoam historicamente a
bacia hidrográfica do Salgado.
Como é possível notar, o fato representa um tácito exemplo de
desequilíbrio, que geralmente decorre da presença de espécies “alienígenas”
afetando desse modo, o equilíbrio natural das demais. Já que uma vez não
encontrando um predador comum a nova
espécie(seja ela animal ou vegetal) termina por se propagar/crescer de maneira célere
e exagerada.
Conforme os próprios pescadores, a espécie em questão começou a surgir pela
primeira vez nos mananciais caririenses há pouco mais de dois anos.
Hoje, no entanto,
já pode ser encontrada em todo o percurso do rio Salgado e afluentes, de onde aliás já migrou para
lagos, lagoas, riachos e açudes localizados no território aurorense e circunvizinhança.
De modo que agora é praticamente impossível não encontrá-lo em qualquer manancial da
região de Aurora e adjacências. Algo que vem causando grande preocupação às
pessoas que pescam, notadamente pelo Cariri Oriental. Portanto, diante de tudo
isso já é possível constatar que as espécies
tradicionais estão praticamente desaparecendo, enquanto o estranho peixe está
se reproduzindo de modo rápido e descontrolado.
As redes de pesca que são utilizadas pelos pescadores quando
são retiradas da água vêm repletas do tal peixe que, por sinal, não possui valor
econômico e nem desperta sequer a apreciação dos próprios sertanejos como alimento. Visto
que, além de possuir um cheiro esquisito e sabor desagradável se mostra bem duro ao
cozinhar.
Há quem diga que o peixe é oriundo do rio São Francisco e ninguém sabe
ao certo como chegou até aqui. Os sertanejos o chamam por puro apelido de “Camborja” e/ou
de “bufão”(fotos). Outros, mesmo erroneamente, o denominam de “cascudo”, posto que pela aparência anatômica
deve ser parente próximo do verdadeiro Cascudo e do Cari – estes sim há tempos habitam
as águas de parte dos rios do Nordeste e, sobretudo de toda a bacia do Salgado.
E, por ser parente do Cari pode se tratar de uma nova espécie de peixe
recém descoberta por estudiosos no rio São Francisco que o denominaram de Hisonotus
bocaiúva, ou ainda, quem sabe, mais uma derivação deste.
Portanto, por absoluta falta de
maiores dados, inclusive científicos, sobre este peixe, esta sua suposta
identificação enquanto espécie constitui apenas uma mera especulação. O certo é que, o espécime
precisa ser urgentemente estudado para
que se possa traçar o seu verdadeiro e
necessário perfil biológico. E, quem sabe, uma tomada de providências.
Muitíssimo semelhante ao Cari, o ‘Camboje’ ou 'bufão' mede aproximadamente de 18 a
22 mm. Possui casca dura, barbatanas, boca na parte inferior da cabeça, uma
crista enorme nas costas(bem no meio do corpo) duas nadadeiras poderosas que o
faz, inclusive, se movimentar arrastando-se com rapidez e facilidade fora d’água.
Respirar
fora da água(ao que parece) não constitui nenhum problema para o “Camborja” (Hoplosternum littorale;, pois não morre
fácil. Há quem afirme que ele sempre sai da água para procurar alimento nas
margens.
Assim, como pouco se sabe sobre ele, sua forma de alimentação é
praticamente desconhecida. O temor é que ele esteja se alimentando dos alevinos/filhotes
das espécies naturais do rio, ou mesmo dos ovos na sua fase embrionária.
O
certo é que o seu crescimento rápido e desordenado vem contribuindo com a diminuição e (até) mesmo com o desaparecimento das espécies nativas da bacia. A disputa desigual por
alimentos também constitui um fator
importante na cadeia que ajuda a entender a razão do possível desaparecimento do pescado
local. Muitas espécies nativas já podem, inclusive, estarem extintas.
Contudo, o aparecimento do tal peixe se soma a outros fatores preponderantes para
o atual processo de desequilíbrio e degradação da fauna e da flora aquática da bacia do rio
Salgado. Quer sejam, a construção desregrada de barragens ao longos dos anos e do rio, o
desmatamento da desenfreado da mata ciliar, o uso indiscriminado de agrotóxicos nas lavouras
às margens do rio, a poluição hídrica ocasionada pelo derramamento de esgotos domésticos, hospitalares
e industriais, a pesca predatória, o assoreamento e mais recentemente, a
construção de moradias praticamente nas ribanceiras do Salgado em muitas cidades.
Que os órgãos competentes possam se debruçar o quanto antes sobre mais
esta complicada problemática ambiental do nosso Cariri; do contrário teremos o desaparecimento
total de todas as espécies endêmicas do nosso rio Salgado.
Estamos adentrando o ponto limite, de forma que, ou resolveremos a questão do Salgado agora, ou daqui a pouco será um caminho sem volta.
...................
Prof. José Cícero
Aurora – CE.
fotos Jc
Informe: https://pt.wikipedia.org/wiki/Tamoat%C3%A1
Informe: https://pt.wikipedia.org/wiki/Tamoat%C3%A1
Um comentário:
Este peixe é muito parecido com um endêmico pelo Litoral Sul, aqui em Santa Catarina é conhecido como "Roça-caminho", isso pelo hábito de percorrer longos trechos fora da água em dias de chuva (é comum achar eles em poças de água de restinga e até de ruas após a chuva). Nunca causou maiores problemas por aqui. Eu cheguei a criar alguns em aquário na época de moleque, eles tinham o hábito de subir pra pegar ar mesmo com o aquário bem oxigenado. É encontrado principalmente em banhados de restinga mal-oxigenados, onde outras espécies tem dificuldade de sobreviver. Come minhocas e insetos, inclusive pode ser pego de anzol.
Postar um comentário