Fco. Pereira da Silva - o famoso poeta BIU PEREIRA |
Cordel do Biu Pereira |
Nos
anos em que comecei a visitá-lo, de quando em vez, na sua humilde moradia
- uma minúscula casinha de taipa, localizada na chamada "baixa do
tinguizeiro" meio escondida abaixo da rodovia na entrada da cidade. Logo
após a chamada curva da Gameleira na direção de quem vai na direção do
Juazeiro.
Numa época em que aquele pequeno 'bairro', era
por assim dizer, também vítima de um imenso preconceito social, visto que
ficava contíguo à chama zona do bairro meretrício, ou "cabaré" como
se chamava naquele tempo.
Jamais me
esqueço da primeira vez que avistei o poeta, sentado no banco, pernas estranhamente
entrelaçadas, tocando viola na conhecida bodega de Chico André.
Estudante adolescente, já tocado por um certo arroubo
literário, resolvi escrever algo sobre o poeta, falando do seu sofrível isolamento,
da sua vida, das agruras, da doença e da suas antigas lidas poéticas pelo oco
do mundo. A matéria havia sido publicada no jornal ‘A Classe Operária’
informativo do PC do B editado em São
Paulo, mas que recebíamos com certa regularidade.
Lembro-me da peleja e do esforço que foi
convencermos o saudoso fotógrafo Pio Luna a se deslocar a pé, do centro da
cidade até o local onde morava o poeta para fazer a fotografia que ilustraria a
tal reportagem.
Recordo-me como se fosse hoje, do poeta posando
para a foto: A viola pendurada num toco da parede, como que denunciando o
abandono daquele ambiente. E o velho
poeta curvado com seus braços em cruz sobre a meia porta da sua
residência. Estavam lá, além do fotógrafo, Eu, Jesualdo(Dedu), Dedé de Quinco e
o também saudoso José Mago. Dedé de Quinco, inclusive, foi quem
pagara o preço da foto.
Diante dos inúmeros cordéis que estavam em poder
do poeta, resolvemos fazer uma campanha para vendê-los nas ruas e nas escolas.
E assim, arrecadarmos um pouco de dinheiro para o velho Biu que estava em
dificuldade, sobretudo para comprar os seus remédios. Naquela época, tudo era
muito mais difícil. E o abandono em que se encontrava o poeta, já debilitado
pela doença que lhe atacava os pulmões e as vias respiratórias, era algo penoso e lamentável.
Ele fumava com sofreguidão. "Não posso mais
adiar o meu encontro com a morte. Por isso não posso deixar de fumar
agora", disse-me ele com um certo sorriso amarelo no canto da boca e o
cigarro no dedo. Olhando a fumaça, disse me certa feita que era a poesia sua
última alegria na vida. Sem ela, o mundo não tinha mais nenhum sentido, dizia.
Muito da sua poesia, era resultante das suas próprias
vivências de cantorias em cantoria pelo
mundo, inclusive pelas quebradas da Aurora. Ele falava muito do riacho do Pau
Branco onde cantou por diversas vezes em noites enluaradas propícias à fina flor da poesia popular dos nossos sertões.
Falava da contribuição
e da amizade fraterna do radialista folclorista mestre Elói Teles ante a publicação
dos seus cordéis, bem como da sua
participação na rádio Araripe e Educadora do Crato onde fez programas durante
alguns anos. Falava ainda, com orgulho e como saudade, do tempo das suas
andanças em que fez parceira com o
próprio Patativa e Pedro Bandeira. Dos programas da rádio Iracema do Juazeiro e
Salamanca de Barbalha. Da vida boêmia e da saúde que naquele instante lhe
faltava.
No meu primeiro livro “Ecos da Saudade”, lançado em 1993 resolvi fazer-lhe uma pequena homenagem ao dedicar a ele o poema
– Biu sempre Biu. Tanto em Jaguaruana, Granja e Aurora sempre recebi algumas
cartas manuscritas pelas mãos do poeta. Algumas tristes e melancólicas, outras
alegres e lisonjeiras, inclusive recheadas de poesias. Pela forma como me
escrevia, sabia como estava o seu estado de saúde, seu espírito e a sua alma de
vate, amigo, humano e valente.
Em 2001 já bastante enfermo e vivendo sob a
caridade alheia o Dr. Edilson Santana e a professora Hilma Freira organizaram o
livro “Versos Populares: Antologia Poética do poeta Biu Pereira” contendo o melhor da produção poemática do decano
poeta da poesia missãovelhense.
Em virtude das freqüentes crises de asma
que o atacavam, quase não mais recitava os seus improvisos poéticos como antigamente e, tampouco dedilhava sua
viola e nem escrevia seus cordéis. Era triste quando o encontrava nestes 'dias
ruins' como ele mesmo chamava. Tinha um poema sobre o cajueiro e o sapo que eu
gostava muito quando recitava de memória para mim.
A vida me levou para longe. Eis a velha luta pela
sobrevivência. Anos depois fui informado por telefone do desencarne do meu amigo poeta. Tristonho
fiquei por vários dias literalmente de
mal com o mundo e com a poesia. Posto que ambos, a meu ver, foram extremamente
ingratos e cruéis como o poeta Biu.
Como a vida é má e hipócrita: Bil Pereira precisou sofrer e morrer
para ser reconhecido e ficar famoso...
Entretanto, conforta-me a lídima constatação de
que Biu foi poeta e, poeta sendo, viverá
eternamente por entre nós.
Viva Bil Pereira! Porque toda poesia sempre será eterna...
............................
(*) Prof. José Cícero
Secretário de Cultura e Turismo
Aurora - CE.
LEIA MAIS EM:
LEIA MAIS EM:
Ainda no FACEBOOK
Nenhum comentário:
Postar um comentário