terça-feira, 10 de junho de 2008

O Adeus bendito do poeta Maldito


E agora Quintana?
O que faremos agora Baudelaire?
Com esta poesia insossa
Sobrevivente que restou, cheia de mágoas.
Agora que a sós estamos,
Como morto-vivos
Solitariamente angustiados,
Vivenciando o drama humano poético.
Agora que calou-se para sempre o grito.
Agora que se foi para a metafísica
a ação, a concretudo do gesto
Do sacrossanto ser - o maldito poeta
que o Acaraú um dia cedeu ao mundo
sob a insígnia do nome - José Alcides Pinto.

Partiu o estro
Como por ironia num verso frio.
Sangue derramado no negro betume
do asfalto da rua
como uma estrofe
Do seu poema mais belo, obsceno, crítico
Sereno, lírico, ensandecido.
Prenhe de sonhos estendidos no meio do povo
Como um velho conhecido
Passeando, contando história de cordel
Aos que ainda têm ouvidos,
A reclamar o absurdo
De tudo aquilo
que ainda faz sentido.

Que tola ironia!
Nosso poeta em choque
Não mais com a palavra brava, indomável.
Porém com a motocicleta.
O tombo, o meio-fio.
A queda-livre do crânio.
Morte fria, macabra, assassina, Antiestética:
o brado esfacelado como em letras soltas;
Pacto celebrado desde o nascimento
Da alcidiana poesia,
Tal qual desconhecido;
Fantástico realismo tecnológico dos fatos.
Concretismo-sentimento
Sempre presente
Como fogo ardente
Na língua e na face
de José Alcides Pinto.

O que faremos agora, Quintana?
Como ficaremos Dimas Macedo?
Agora que só nós restou
Toda a liturgia do pleno Caos
Poético-literário
Marcado pelo sangue
Ainda a escorrer no chão escuro do asfalto
em meio a multidão de curiosos
desconhecidos,
Em que nosso vate maldito
Escreveu no silêncio
Do seu último instante
Todo o fatalismo clarividente
Do seu derradeiro verso.

Adeus maldito!
Até breve poeta
Da morte e da vida
- José Alcides Pinto.
Recomendações e lembranças
a Leminski, Garcia, Neruda, Vinícius
E todos os demais amigos
Da arte poética
Em que finalmente
Venceste a morte,
Ganhaste vida nova
Na geometria estranha
Do teu verso eterno.
____
José Cícero
In O Povo

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